Notícias sobre o Curso de Direitos Fundamentais

Agora é definitivo.
Finalmente, já tenho uma posição sobre a publicação do livro. Não quis dizer nada antes porque eu ainda estava em negociação com algumas editoras interessadas em publicar a obra.
Mas, no início desta semana, tive a imensa satisfação de receber um e-mail informando que o conselho editorial da Atlas aprovou o meu Curso de Direitos Fundamentais e que a sua publicação ocorrerá em aproximadamente três meses, seguindo o cronograma de revisão do texto e divulgação da obra.
Vocês não imaginam o orgulho que estou sentindo. É bom saber que uma das maiores editoras jurídicas do país acreditou no meu trabalho, apesar de eu ser totalmente desconhecido no mercado editorial. Ou seja, acho que o livro está bom mesmo (“plim plim”).
Agradeço publicamente ao amigo Hugo de Brito Machado Segundo por haver me apresentado aos membros do conselho editoral da Atlas. A apresentação não poderia ser melhor. Vejam o primeiro e-mail que ele enviou para a editora recomendando a publicação do livro:

“Envio-lhes, como anexo, arquivo contendo livro escrito por um amigo meu, George Marmelstein Lima, mestre em Direito, professor da Faculdade Sete de Setembro e Juiz Federal aqui no Ceará.



Trata-se de um “Curso de Direitos Fundamentais”, voltado basicamente para os alunos dos cursos de graduação em Direito.



Diversas faculdades já têm, além das cadeiras de Direito Constitucional, a disciplina “Direitos Fundamentais” ou “Teoria dos Direitos Fundamentais”, sendo este o “Livro-texto” para tal disciplina. Aliás, o autor é professor precisamente dessa disciplina, e elaborou o livro pensando nela e em seus alunos, em suas dúvidas e dificuldades etc.



Embora em dia com o que de mais contemporâneo se escreveu sobre o assunto, aqui e no exterior, e com a jurisprudência do STF, da Corte Constitucional Alemã e a Suprema Corte Norte Americana, o livro está escrito em linguagem clara, atual e leve. Acredito que mesmo o mais desinteressado aluno encontrará nele momentos de diversão, o que o torna forte candidato à posição de “best-seller” na área.



O estilo, realmente, rompe paradigmas. Não é formal, árido e impessoal. Parece uma conversa, mantida entre o professor e o aluno. Inclusive com ilustrações, que tornam ainda mais agradável a leitura, aspecto essencial dentro de um universo cada vez maior de alunos que, paradoxalmente, não gostam de ler. E isso, insisto, sem prejuízo da responsabilidade e da profundidade com que cada assunto é tratado.



Bom, mas vou parar de tecer juízos de valor em torno do livro. Está anexo, e vocês mesmos poderão conferir, e tirar suas conclusões”.

Dava para não aprovar?

As empresas de publicidade que queiram contratar um excelente marqueteiro é só entrar em contato com o Hugo no site: http://direitoedemocracia.blogspot.com/ :-)

Efeito Cliquet

A prova de direito constitucional do último concurso para Procurador da República foi simplesmente hilária. Depois vou fazer um post só sobre ela.

Por enquanto, vou ficar só com uma questão: que diabo é efeito cliquet?

Numa versão bem primitiva do Curso, havia um tópico específo para o assunto (na verdade, para o princípio da vedação de retrocesso, que é a mesma coisa). Como ainda não estou muito seguro da existência desse princípio, preferi retirar do livro. Agora acho que vou colocar de novo. Eis como está redigido:

Princípio da Vedação de Retrocesso

Por George Marmelstein, Juiz Federal e Professor de Direito Constitucional
No julgamento da ADIn 1.946/DF, acima mencionado, no qual o STF entendeu que o direito ao salário maternidade seria uma cláusula pétrea, houve uma aplicação, ainda que não tão evidente, do chamado princípio do não-retrocesso.

Esse princípio, de acordo com Canotilho, significa que é inconstitucional qualquer medida tendente a revogar os direitos sociais já regulamentados, sem a criação de outros meios alternativos capazes de compensar a anulação desses benefícios[1]. Assim, em tese, somente seria possível cogitar na revogação de direitos sociais se fossem criados mecanismos jurídicos capazes de mitigar os prejuízos decorrentes da sua supressão.

Acolhendo esse entendimento, o Tribunal Constitucional português já decidiu, no acórdão 39/84, que “a partir do momento em que o Estado cumpre (total ou parcialmente) as tarefas constitucionalmente impostas para realizar um direito social, o respeito constitucional deste deixa de consistir (ou deixa de constituir apenas) numa obrigação positiva para se transformar ou passar também a ser uma obrigação negativa. O Estado, que estava obrigado a actuar para dar satisfação ao direito social, passa a estar obrigado a abster-se de atentar contra a realização dada ao direito social” [2].

Na França, a jurisprudência do Conselho Constitucional reconhece que o princípio da vedação de retrocesso (por ele chamado de “effet cliquet”) se aplica inclusive em relação aos direitos de liberdade, no sentido de que não é possível a revogação total de uma lei que protege as liberdades fundamentais sem a substituir por outra que ofereça garantais com eficácia equivalente.

A idéia por detrás do princípio da proibição de retrocesso é fazer com que o Estado sempre atue no sentido de melhorar progressivamente as condições de vida da população. Qualquer medida estatal que tenha por finalidade suprimir garantias essenciais já implementadas para a plena realização da dignidade humana deve ser vista com desconfiança e somente pode ser aceita se outros mecanismos mais eficazes para alcançar o mesmo desiderato forem adotados. Esse mandamento está implícito na Constituição brasileira e decorre, dentre outros, do artigo 3º, da CF/88, que incluiu a redução das desigualdades sociais e a construção de uma sociedade mais justa e solidária entre objetivos da República Federativa do Brasil, sendo inconstitucional qualquer comportamento estatal que vá em direção contrária a esses objetivos.

Alguns juristas defendem, com certa razão, que é extremamente difícil reconhecer com absoluta certeza o que é retrocesso e o que é avanço em matéria de direitos fundamentais. É que, muitas vezes, uma medida pode ser um retrocesso para um determinado direito fundamental, mas, ao mesmo tempo, pode contribuir para dar mais efetividade a outros valores igualmente importantes.

Assim, por exemplo, a revogação da lei de imprensa pode ser vista como um grande avanço para a liberdade de expressão. Por outro lado, os direitos de personalidade (honra, intimidade, privacidade etc.) podem ficar sem proteção, caso não sejam criados mecanismos alternativos equivalentes aos previstos na lei de imprensa. Sob a ótica dos direitos de personalidade, revogar a lei de imprensa viola a idéia de vedação de retrocesso. Qualquer avanço que for dado para favorecer a liberdade de expressão será necessariamente um retrocesso para a proteção dos direitos de personalidade e vice-versa. Levado às últimas conseqüências, o princípio da vedação de retrocesso seria capaz de gerar o indesejado efeito de paralisar qualquer mudança no âmbito dos direitos fundamentais.

Isso vale também para os direitos sociais. É que nem todos os benefícios assistenciais alcançam resultados positivos em longo prazo, já que geram uma situação indesejável de dependência entre os seus beneficiários em relação ao Estado.

Os programas de assistência social, embora possam ser permanentes e duradouros, devem ter sempre em mira a obtenção de resultados concretos e positivos. Quando isso não ocorre, nada impede a revogação do benefício. Assim, muitas vezes, pode ser necessário revogar determinados benefícios sociais já concedidos, caso se demonstre concretamente que eles não estão reduzindo as desigualdades sociais nem promovendo uma distribuição de renda, mas, pelo contrário, desestimulando a busca pelo emprego e premiando o ócio. Vale ressaltar que essa demonstração não pode ser meramente retórica. Ou seja, será preciso apresentar dados confiáveis que indiquem a ineficácia da medida social e as vantagens que a sua revogação trará.

Em síntese: o princípio do retrocesso social não deve ser visto como uma barreira instransponível para qualquer mudança no âmbito dos direitos fundamentais. O que ele exige é que a revogação de leis que regulamentem os direitos fundamentais seja justificada do ponto de vista do desenvolvimento humano. Viola o conteúdo material da Constituição Federal a adoção de medidas legislativas que não cumpram os objetivos do artigo 3º.

[1] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 5ª ed. Coimbra: Almedina, 2002, p. 336.
[2] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 5ª ed. Coimbra: Almedina, 2002, p. 475/476.

Um exemplo de "concordância prática"

Alguns podem pensar que estou sendo incoerente ao não publicar uma versão digital do livro (Curso de Direitos Fundamentais) aqui no blog. Afinal, não sou eu um grande defensor da democratização do conhecimento?
Ocorre que, no caso, há uma colisão de valores. :-)
De um lado, minha vontade sincera é divulgar o livro para que a maior quantidade de pessoas tenham acesso a ele. Por mim, o livro já estaria disponível aqui na íntegra, gratuitamente, para qualquer interessado.
O problema é que (e aqui surge a colisão de valores) nenhuma editora seria louca de custear toda a edição e publicação de um livro que já está disponível na internet. É uma regra simples de mercado que não preciso explicar.
Em casos de colisão de valores, a primeira preocupação é sempre tentar conciliar os interesses em jogo, de modo que nenhum seja sacrificado de forma absoluta. Ou seja, tenta-se equilibrar ou harmonizar os interesses conflitantes (princípio da concordância prática). Não posso simplesmente disponibilizá-lo “on-line” e esquecer a publicação em papel (que tem também uma importância especial para mim) como também não posso publicá-lo em papel e esquecer o compartilhamento de informações proporcionado pela internet.
Desse modo, aplicando o princípio da concordância prática, tomei a seguinte decisão: durante o primeiro ano do livro, divulgarei, na internet, apenas o essencial do seu conteúdo, a fim de prestigiar os interesses comerciais da editora que irá financiar, sem nenhuma garantia de retorno, a sua publicação. Depois, se o livro não emplacar no mercado “de papel”, terei o maior prazer de disponibilizá-lo on-line de forma gratuita.
Só mais uma coisa.
Cascavilhando uns arquivos do meu antigo site, encontrei um “editorial” (que nada mais era do que um embrião deste blog), datado de 24 de novembro de 2003, que dizia assim: “A propósito, decidi escrever um Curso de Direitos Humanos e Direitos Fundamentais. É um projeto a longo prazo e espero concluí-lo lá pelo ano de 2006. Vou ver se fico colocando alguns capítulos aqui no site…
Como prazo de juiz é sempre impróprio, creio que o atraso de dois anos até que não foi tão longo assim… :-)
De qualquer modo, foram praticamente cinco anos escrevendo este livro (isso sem falar que nos anos anteriores eu já estava envolvido academicamente com o tema). O Curso, realmente, representa muito para mim. Daí a minha preocupação em publicá-lo em papel. Se não fosse isso, certamente eu o disponibilizaria aqui no blog, até porque TODOS os meus trabalhos acadêmicos estão acessíveis para quem quiser, inclusive dissertação de mestrado, monografias de especialização, entre outros, que certamente poderiam ser publicados “em papel”.
Era isso. De qualquer modo, tentarei com a editora um desconto especial para os fiéis visitantes deste blog ou até mesmo o sorteio de alguns livros para os comentadores… :-)

Uma pausa e, finalmente, o Capítulo 1

Nesta semana, estarei em “exílio forçado” na Fazenda de minha esposa para concluir o Curso de Direitos Fundamentais. Sem internet, sem kitesurf e sem celular…

De qualquer forma, deixo o Capítulo 1 logo abaixo, aguardando (leia-se: exigindo) críticas e comentários.

Fiz uma mudança geral no Curso. Excluí a “Parte Zero” e estou enxugando mais o texto.

Por isso, para aqueles que ainda não leram nada, basta ler a “Apresentação do Curso“, que reformulei e o Capítulo 1.

Por uma questão de respeito à editora que provavelmente publicará o curso “em papel”, não poderei disponibilizar o texto na íntegra. De qualquer modo, a minha idéia é incluir, neste blog, algumas partes até como forma de divulgação.

Era isso. Mais uma vez insisto por comentários/críticas/sugestões…

P.S.

Aos alunos interessados no estágio voluntário, informo que, na volta, enviarei uma resposta para os e-mails divulgando o resultado da seleção. No mais tardar, no final de janeiro, devo estar chamando para o início dos trabalhos, que começará após o carnaval.

Textos Selecionados – Teoria dos Direitos Fundamentais (aprofundamento)

Enquanto o “Curso de Direitos Fundamentais” não sai, aproveito o blog para fornecer aos alunos um material de estudo aprofundado a respeito da teoria dos direitos fundamentais.

São trechos de livros ou revistas (geralmente, capítulos/artigos), por mim selecionados, especialmente para os alunos da disciplina “Direito Constitucional II – Teoria dos Direitos Fundamentais”.

Trata-se, portanto, de material utilizado para fins exclusivamente didáticos, sem qualquer fim lucrativo. Aliás, nunca é demais ressaltar: o presente blog não tem qualquer finalidade lucrativa. Nem mesmo há banners de publicidade ou de Adsense (lucro indireto). Meu interesse é tão somente divulgar os direitos fundamentais. Fazer com que o estudante de direito se encante com esse tema e, na sua futura atividade profissional, lute pela efetivação desses valores constitucionais. Mesmo assim, caso algum autor ou editora não queira ter a obra aqui divulgada, excluirei o link sem qualquer problema.

Os autores abaixo (aliás, menos um: eu) são as maiores autoridades em direitos fundamentais atualmente aqui no Brasil (alguns são estrangeiros, na verdade). São juristas antenados e influentes, que estão quebrando paradigmas e criando novos conceitos e princípios totalmente diferentes do pensamento jurídico tradicional. Se você analisar a sugestão bibliográfica já apresentada, vai perceber que a grande maioria desses juristas possui livros publicados sobre os direitos fundamentais. Vale a pena comprar os livros por eles escritos, pois eles estão na vanguarda. Os textos aqui disponibilizados são, na verdade, apenas fragmentos do pensamento desses juristas.

Fiz questão de colocar textos de autores com orientação ideológica diversa, justamente para dar mais pluralidade ao debate. Por enquanto, somente recomendei textos em língua portuguesa. Em breve, estarei fazendo um post semelhante com autores de outras línguas.

Logicamente, há diversos outros constitucionalistas igualmente bons (aliás, de cara, sinto a falta, na relação abaixo, do Professor Paulo Bonavides). Mas a minha idéia é ir acrescentando outros juristas aos poucos e fazer deste espaço, quem sabe, a maior biblioteca virtual sobre direitos fundamentais.

Por isso, quem tiver sugestão de outros textos relevantes dentro dessa temática (direitos fundamentais) fique à vontade para enviar.

Conceito e evolução dos Direitos Fundamentais

1. Vilhena, Oscar. A Gramática dos Direitos Humanos.

Slides das Aulas (Apresentações em Power Point)

Conforme prometido, eis as apresentações em “.ppt” na ordem em que estão sendo mostradas em sala de aula:
_________________________________
Direito Constitucional II (Direitos Fundamentais)
2. Evolução Histórica dos Direitos Fundamentais (parte 1parte 2)
4. Características dos Direitos Fundamentais (parte 1parte 2)

5. Princípios de Interpretação-Concretização dos Direitos Fundamentais (parte 1parte 2parte 3)

6. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

7. Direito à Vida (parte 1parte 2parte 3)

8. Direitos de Personalidade

9. Garantia do Sigilo

10. Direito à Imagem

11. Igualdade

12. Propriedade

Revisão Geral das aulas

Novo: Os Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988 (via rapidshare)

Novo: Características dos Direitos Fundamentais (via rapidshare) – 4mb

Novo: Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais (via rapidshare) – 5mb

Moralidade Eleitoral e Vida Pregressa dos Candidatos (via rapidshare)

Os Direitos Fundamentais e os Vinte Anos da Constituição (via rapidshare)

________________________________

Juizados Especiais Federais (aula de especialização – ESMEC – obs: arquivo em PDF – 37 mb)

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Aulas de Direito da Informática

2. Documentos Eletrônicos

3. Contratos Eletrônicos

4. Responsabilidade Civil dos Provedores

5. Direitos Autorais na Internet

7. Penhora on-line (bacenjud) – (via rapidshare) – 4mb

8. Tecnologia da Informação e Poder Judiciário (via rapidshare) – 4mb

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Slides de James Rachels

Em breve, mais slides.

Curso de Direitos Fundamentais – Parte I – Abrindo as Portas para os Direitos Fundamentais

Dando continuidade ao Curso de Direitos Fundamentais, postarei mais um capítulo do livro que está por vir (ô parto difícil!). É a partir daqui que começa o curso pra valer. Os textos já publicados – que incluí na chamada “Parte Zero” – não fazem parte do Curso propriamente dito.
Como já afirmei, são apenas uma forma de motivar o aluno e de situar o leitor acerca do meu pensamento acerca do direito.
Sendo assim, aproveite o começo do Curso. Imploro por críticas e sugestões. Qualquer comentário – positivo ou negativo – é bem-vindo. Eu preciso saber se o Curso está agradando. Do contrário, pouparei meu tempo e meu esforço e desistirei dessa tão difícil tarefa.
Lá vai:

1. Abrindo as portas para os direitos fundamentais

A teoria dos direitos fundamentais está em seu auge junto à comunidade jurídica brasileira. Pela quantidade de textos produzidos sobre o assunto, é fácil perceber que, pelo menos na teoria, os direitos fundamentais estão na moda.
Como conseqüência disso, é possível perceber nitidamente que a hermenêutica dos direitos fundamentais já ocupa um papel de vanguarda dentro da interpretação jurídica. Quem não estiver preparado para acompanhar e compreender esse fenômeno pode ficar para trás. O trem da história passa depressa e não espera.
Certamente, esse interesse geral pelos direitos fundamentais não é apenas um modismo passageiro. Basta ver a postura do próprio Supremo Tribunal Federal (STF) para perceber que essa nova concepção veio para ficar. Praticamente todos os casos mais polêmicos submetidos ao julgamento da mais alta Corte do país estão sendo solucionados com base nas premissas dessa nova teoria. Colisão de direitos, ponderação, sopesamento, proporcionalidade, vedação de excesso, reserva do possível, etc., são termos desenvolvidos pela teoria dos direitos fundamentais que aparecem com cada vez mais freqüência nos votos dos ministros do STF. Não há dúvida de que a teoria dos direitos fundamentais já saiu das páginas acadêmicas dos livros jurídicos para entrar, de vez, no showroom do discurso forense adotado pelos juízes e demais profissionais do direito.
Qual será a razão desse interesse todo em torno dos direitos fundamentais? Por que será que essa teoria está seduzindo e deslumbrando tantos juristas brasileiros e estrangeiros?
Há várias razões para isso, mas uma, a meu ver, é a mais forte: é inegável que as discussões envolvendo direitos fundamentais são extremamente polêmicas, já que suas premissas se baseiam não apenas em normas jurídicas, mas também em aspectos emotivos, ideológicos, políticos, econômicos e até religiosos. Imagine temas como o aborto, a eutanásia, as cotas para negros em universidades (ações afirmativas), a adoção de crianças por casais do mesmo sexo, o próprio casamento gay, a admissão de mulheres nas forças armadas, a discriminação racial, o respeito às diferenças religiosas e culturais, a proteção ao meio-ambiente etc. Sem dúvida, esses temas não são estritamente jurídicos. No entanto, são temas que, freqüentemente, são objeto de discussões jurídicas, travadas no âmbito do Poder Judiciário. E os juízes, por obrigação constitucional, devem pautar suas decisões não em “achismos” ou caprichos pessoais, muito menos em dogmas religiosos, mas em argumentos racionais e objetivos que sejam compatíveis com os valores constitucionais. Vale lembrar que o Brasil é um Estado Democrático de Direito, no qual a Constituição funciona como fundamento de toda a ordem jurídica. Logo, o fato de ser impossível obter uma solução estritamente técnico-jurídica em questões envolvendo direitos fundamentais, uma vez que as concepções político-ideológicas são inafastáveis, não deve minimizar a necessidade de se perseguir uma solução justa, que, ao mesmo tempo, seja aceita pelo o ordenamento jurídico. Fora da Constituição não há decisão legítima.
E aí que entra em cena a grande vantagem da teoria dos direitos fundamentais, pois ela possibilita que sejam encontradas soluções ao mesmo tempo justas e constitucionalmente adequadas. A teoria dos direitos fundamentais fornece mecanismos teóricos capazes de auxiliar o jurista na busca de uma solução compatível com as normas constitucionais.
O papel principal da teoria dos direitos fundamentais é precisamente ajudar a encontrar respostas racionalmente fundamentadas nas polêmicas questões envolvendo direitos fundamentais, além de possibilitar uma maior transparência e objetividade na argumentação jurídica e no processo decisório.
E por que somente agora essa teoria está fazendo tanto sucesso?
O grande prestígio alcançado pela teoria dos direitos fundamentais, nos últimos anos, aqui no Brasil, deve-se, sem dúvida, à Constituição Federal de 1988 (CF/88), que inaugurou um novo ciclo centrado nos direitos fundamentais.
Após a Constituição de 88, todos os institutos jurídicos estão sendo objeto de uma releitura tendo como base os valores constitucionais. Como explica Daniel Sarmento, “todos os ramos do Direito, com suas normas e conceitos, devem sujeitar-se a uma verdadeira ‘filtragem’ constitucional, para que se conformem à tábua axiológica dos direitos fundamentais” (SARMENTO, Daniel. Livres e Iguais: Estudos de Direito Constitucional. São Paulo: Lúmen Juris, 2006, p. 114).
Daí se falar hoje em uma verdadeira constitucionalização do Direito, que faz com que as normas constitucionais se irradiem pelas diversas áreas do ordenamento jurídico. Quem se destaca com isso são os direitos fundamentais que passam a ocupar uma função estratégica de fundamentação e de legitimação do sistema normativo como um todo.
Esse fenômeno – a constitucionalização do Direito e a força irradiante dos direitos fundamentais – é facilmente explicável.
Toda Constituição é fruto de uma ruptura com o passado e de um compromisso com o futuro. Ela rompe com o passado, revogando a ordem jurídica anterior, e faz surgir em seu lugar outro sistema normativo, calcado nos novos valores que inspiraram o processo constituinte.
Com a CF/88 não foi (nem é) diferente. Nossa Constituição pretendeu sepultar o cadáver autoritário da ditadura militar e representou, para os brasileiros, a certidão de nascimento de uma democracia tardia, mas sempre aguardada.
A sociedade brasileira tinha vivido praticamente 30 anos de supressão de liberdades em razão do regime militar. Durante a ditadura, não havia liberdade de expressão, muito menos liberdade política. Já a tortura, as perseguições ideológicas e a repressão eram praticamente institucionalizadas. Portanto, era hora de ousar em favor dos direitos fundamentais e deixar o sopro da democracia entrar nas janelas do poder. A sociedade exigiu isso ao sair nas ruas, durante os anos 80, pedindo por “Diretas Já”.
A Constituição de 88 é fruto desse clamor popular. No mesmo dia em que ela foi promulgada, ou seja, em 5 de outubro de 1988, Ulisses Guimarães, o Presidente da Assembléia Constituinte, proferiu seu famoso discurso enaltecendo a nova Constituição “cidadã”. Perceba a força retórica de suas palavras:
“O Homem é o problema da sociedade brasileira: sem salário, analfabeto, sem saúde, sem casa, portanto sem cidadania. A Constituição luta contra os bolsões de miséria que envergonham o país. Diferentemente das sete constituições anteriores, começa com o homem. Graficamente testemunha a primazia do homem, que foi escrita para o homem, que o homem é seu fim e sua esperança. É a constituição cidadã. Cidadão é o que ganha, come, sabe, mora, pode se curar. (…) É a Constituição Coragem. Andou, imaginou, inovou, ousou, ouviu, viu, destroçou tabus, tomou partido dos que só se salvam pela lei. A Constituição durará com a democracia e só com a democracia sobrevivem para o povo a dignidade, a liberdade e a justiça”.
Esse discurso bem demonstra o simbolismo da Constituição de 1988, que, mesmo correndo o risco não ser efetivada por ausência de vontade política (como até hoje não foi), assumiu uma postura corajosa e avançada em favor da redução das desigualdades sociais, dos oprimidos, dos direitos fundamentais, da democracia e de todos os valores ligados à dignidade da pessoa humana.
Embora ainda exista um grande descompasso entre o texto constitucional e a realidade sócio-econômica brasileira, são nítidos os avanços em matéria de direitos fundamentais desde que a Constituição passou a vigorar.
Não há dúvida de que a Constituição Federal de 1988, apesar de seu curto período de existência, iniciou uma nova era no cenário jurídico brasileiro, onde a proteção normativa dos direitos fundamentais e dos valores democráticos adquiriu um destaque nunca antes visto.
Nesse aspecto, a Constituição de 88 é um marco, uma divisora de águas. Desde o seu preâmbulo, o constituinte demonstrou seu compromisso em favor dos direitos fundamentais. Nele está posto que a finalidade da República Federativa do Brasil é instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.
Ao longo do texto constitucional estão previstos inúmeros direitos fundamentais. A grande maioria desses direitos está logo no início da Constituição, no rol de direitos fundamentais previsto no Título II da Constituição, que engloba os artigos 5º a 17, com seus mais de cem incisos somados. Os valores mais próximos da dignidade da pessoa humana estão positivados na Constituição Federal de 1988. Aliás, o próprio princípio da dignidade da pessoa humana foi positivado como fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, inc. III, da CF/88).
E a Constituição não parou por aí. Ela também forneceu diversos instrumentos processuais, políticos e econômicos para a implementação dos direitos fundamentais, demonstrando que teve verdadeiramente a intenção honesta – e não meramente retórica – de tornar esses direitos uma realidade concreta.
Daí o incrível salto de qualidade dado pela doutrina brasileira, em matéria de direitos fundamentais. Essa virada constitucional é a responsável pela mudança de paradigma que fez com que o direito positivo deixasse de ser visto como um instrumento de opressão para se transformar também em um instrumento de mudança social.
Neste Curso de Direitos Fundamentais, será possível conferir essa transformação, onde o legalismo dos códigos, que sempre dominou o pensamento jurídico brasileiro, está rapidamente sendo substituído pelo discurso dos princípios constitucionais e pela preocupação em construir uma Constituição “pra valer”.
Aqui, serão conhecidas as mais avançadas teses a respeito dos direitos fundamentais, sempre tentando ilustrar, com exemplos, as implicações práticas de cada pensamento teórico.
Esta primeira parte tem como objetivo abrir as portas da teoria dos direitos fundamentais. Serão vistos alguns pontos básicos necessários à compreensão da teoria, como, por exemplo, o conceito, a evolução histórica e as características dos direitos fundamentais.
Além disso, para melhor assimilação do tema, serão revistas algumas noções já estudadas nas disciplinas Teoria do Estado e da Constituição, como o princípio da separação de poderes, a jurisdição constitucional, a supremacia da Constituição etc. Aliás, com freqüência, será preciso relembrar alguns conceitos dessas disciplinas demonstrando a importância de uma boa base introdutória para avançar no estudo do direito.
Comecemos pelo conceito. O que são os direitos fundamentais?
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