Há uma noção de senso comum de que vários membros de grupos estigmatizados são vítimas de discriminação mais ou menos velada em vários setores da vida, não só no Brasil, mas em praticamente todas as partes do mundo. Pessoas negras são mais abordadas pela polícia e são desproporcionalmente acusadas e condenadas pela justiça criminal. Mulheres são menos promovidas do que os homens para cargos de alta direção de empresas. Pessoas obesas têm mais dificuldades de serem contratadas e costumam ser mais demitidas. E assim por diante.
O que poucos sabem é que há um campo de estudo em franca expansão que tem realizado descobertas surpreendentes sobre o chamado “preconceito implícito” (implicit bias), que pode ser uma das causas desse fenômeno.
O implicit bias é um vício cognitivo que se manifesta de forma automática e inconsciente, podendo afetar qualquer pessoa, independentemente de suas crenças ou valores. Isso mesmo: até mesmo pessoas que incorporaram valores igualitários em seu sistema de crenças podem tomar decisões enviesadas, motivadas inconscientemente por preconceitos implícitos. Aliás, até mesmo membros de grupos estigmatizados podem ser afetados por preconceitos implícitos, seja em relação ao seu próprio grupo, seja em relação a outros grupos estigmatizados.
Para muitos cientistas, os preconceitos implícitos podem ser uma das principais fontes das práticas discriminatórias nas sociedades contemporâneas, que vivem o dilema de estarem explicitamente comprometidas com a proteção da igualdade, mas não conseguiram eliminar completamente a influência de falsos estereótipos em relação a determinados grupos.
Para analisar como isso pode impactar no pensamento jurídico, escrevi um artigo que submeto, temporariamente, a um debate prévio antes de ser enviado à publicação acadêmica. De longe, foi o artigo mais difícil (e mais empolgante) que já escrevi até agora. No começo, eram apenas algumas intuições preliminares e, quando me dei conta, estava envolvido em um novo mundo de conhecimento, cheio de possibilidades para investigações futuras. Enfim, espero que o tema também empolgue outros pesquisadores jurídicos. Sugestões, críticas e comentários são bem vindos. Aqui vai o link:
Marmelstein, George – Discriminação por Preconceito Implícito – https://www.academia.edu/s/8ea40734d4?source=link
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Quem quiser fazer um teste para saber se possui ou não preconceitos implícitos, basta visitar o site do Projeto Implicit, da Universidade de Harvard.
Se quiser fazer um teste um pouco menos abstrato, simulando uma situação em que o preconceito implícito pode significar a morte ou a vida de um ser humano inocente, há um programa de computador desenvolvido por pesquisadores da Universidade do Colorado bem interessante, denominado The Police Officer’s Dillema.
A fonte de pesquisa bibliográfica está toda citada no artigo, mas também assisti a algumas palestras disponíveis na internet:
Anthony Greenwald – Implicit bias: how should psychological science informe the law? – Part I
Jerry Kang – Implicit bias: how should psychological science informe the law? – Part II
Derald Wing Sue – Implicit Bias and Microagressions: the macro impact of small acts
Claude Steele -Explains impact of stereotype threat on achievement
Claude Steele – How Stereotypes Affect Us
Susan Fiske – Perils of Prejudice
Paul Bloom – Pode o preconecito ser algum dia uma coisa boa?
Existe doença genética impede o seu portador de se tornar racista. São aquelas pessoas atingidas pela Síndrome de Williams, tornando-as hipersociáveis, sem a formulação de estereótipos negativos.
O medo social define entre membros do próprio grupo e membros de um grupo estranho. Em nível científico suspeita-se que essa divisão entre o grupo do indivíduo e os outros grupos seja uma das bases psicológicas profundas dos comportamentos racistas.
Luhmann: E como se operacionaliza, como evitamos o preconceito a partir do direito (autorreferência), e não a partir da visão do observador externo?