A Emagis – Escola da Magistratura da 4a Região disponibilizou na sua página o “Caderno do Currículo Permanente – Direitos Fundamentais”, que serviu como material escrito das aulas que ministrei em 2008. Aqui o link.
Eis o texto de apresentação:
O direito constitucional, no Brasil, renasceu após a Constituição Federal de 1988. Creio que ninguém duvida disso.
Durante esses vinte anos de desenvolvimento e evolução do constitucionalismo brasileiro, os estudiosos do direito constitucional gastaram praticamente todas as suas energias para defender a supremacia da Constituição e a máxima efetividade das normas constitucionais. Não se pode negar que o esforço valeu a pena, já que hoje são poucos os que duvidam da força normativa da Constituição e da possibilidade de o Judiciário exercer o controle de constitucionalidade dos atos normativos.
Apesar disso, o avanço do direito constitucional não está completo. Existe ainda uma lacuna muito grande no estudo do conteúdo ético das normas constitucionais. Os juristas tiveram grande êxito em dissecar os aspectos processuais do controle de constitucionalidade, mas esqueceram que o importante, dentro do ensino dessa disciplina, é fazer com que as pessoas assimilem e compartilhem os mesmos valores que inspiram o ordenamento constitucional.
Esse vácuo aos poucos vem sendo preenchido, graças ao avanço da proteção judicial dos direitos fundamentais, inclusive no âmbito do Supremo Tribunal Federal.
Acredito que uma nova fase no constitucionalismo brasileiro está começando, onde a preocupação será principalmente em como concretizar os direitos fundamentais através da jurisdição constitucional. O controle de constitucionalidade, de agora em diante, será o básico; os direitos fundamentais, o “plus”. É o que se pode chamar de Constitucionalismo 2.0, para lembrar os vinte anos da Constituição. O foco agora será o conteúdo ético da Constituição e não uma análise meramente formal das normas constitucionais.
Foi dentro desse contexto que recebi com muita alegria o convite para participar do Módulo V do Currículo Permanente de Direito Constitucional da Emagis, que girará em torno de um único tema: os direitos fundamentais.
O destaque que a Emagis está dando aos direitos fundamentais demonstra que a Escola está em sintonia com os novos rumos do direito constitucional brasileiro. É de suma importância que a magistratura federal como um todo perceba essa mudança de paradigma, sabendo extrair das normas constitucionais os valores éticos necessários à construção de uma sociedade mais justa e solidária, tal como imaginada pelo constituinte originário. O objetivo do presente texto é facilitar esse processo.
Procurei apresentar um quadro geral desse novo constitucionalismo, através de um texto relativamente informal e sem muita preocupação com a estética acadêmica. Evitei citações excessivas e apelo aos argumentos de autoridade, que costumam prevalecer no discurso jurídico tradicional.
Algumas passagens foram extraídas de meu “Curso de Direitos Fundamentais”, publicado pela editora Atlas; outras, extraí de meu blog: “direitos fundamentais.net”, onde procuro sempre debater os temas mais polêmicos e atuais envolvendo essa matéria. Boa parte do texto, contudo, foi escrita especialmente para o curso a ser ministrado na EMAGIS. Espero que seja uma leitura agradável e proveitosa.
Fortaleza, 22 de agosto de 2008
George Marmelstein
Boa tarde Professor,
acompanho suas palavras através do blog e já posso dizer que tenho uma nova perspectiva acerca dos direitos fundamentais. Há algum tempo venho pensando que nossa sociedade ainda está muito distante de permear suas relações sociais, estas consideradas com o Poder Público e as particulares, com os mandamentos constitucionais, principalmente os direitos fundamentais. É essencial para o fortalecimento da democracia que sua população tome para si, para seu íntimo, os fundamentos e direitos previsto em sua Carta Magna promulgada.
Percebo que há muita facilidade para cobrar do Poder Público ações concretas permeadas pelos direitos fundamentais, mas existe muita dificuldade de nossa parte em atuar em conformidade com os mesmos direitos em nossas relações privadas.
Creio que com essa mudança de perspectiva do Direito Constitucional, se atingido o mesmo sucesso de sua primeira versão (utilizando o paradigma de V.Sa.), nossa sociedade irá se amadurecer e poderemos alcançar níveis cada vez mais dignos de humanização individual e coletiva.
Obrigado pela atenção.
George,
Acompanho as discussões no seu blog e gosto bastante do enfoque e das reflexões propostas acerca da efetivação dos direitos fundamentais.
Porém, ultimamente, talvez em virtude de leituras que tenho feito no mestrado da UFPE, tenho me tornado um pouco cético em relação à expansão de valores principiológicos interpretados por juristas que se dedicam ao estudo da Constituição e por juízes que cuidam de dar-lhes aplicabilidade. Nele parece existir a defesa “apaixonada” de que se o discurso jurídico-constitucional for massivamente difundido entre a população, nós passaríamos a viver num estado maravilhoso de coisas.
Talvez por isso eu não concorde com a seguinte passagem do seu texto: “Os juristas tiveram grande êxito em dissecar os aspectos processuais do controle de constitucionalidade, mas esqueceram que o importante, dentro do ensino dessa disciplina, é fazer com que as pessoas assimilem e compartilhem os mesmos valores que inspiram o ordenamento constitucional.”
Ressalto o quão importante considero a percepção por toda a sociedade do valor que a CF/88 representa e como essa percepção pode ser utilizada numa perspectiva transformadora, mas será que é papel dos juristas “fazer com que as pessoas assimilem e compartilhem os mesmos valores”, quando estamos diante de um democracia tão plural como a brasileira e que, não necessariamente, as pessoas querem as mesmas coisas nem ao mesmo tempo?
A discussão passa pela escolha de um modelo consensual ou pluralista-procedimental de exercício dos direitos, e é justamente sobre as vantagens e desvantagens de um ou outro modelo que eu gostaria de ouvir, dentro do possível (crueldade), a sua opinião.
Abraço!
Ótimo material!!
Particularmente, achei interessantíssima a ídeia do constitucionalismo 2.0.
Abraço professor.
Muito bom, principalmente a referência quanto ao Constitucionalismo 2.0. Abraços.
Prezado Dr. George,
O material é de boa qualidade. Contudo, a parte que reputo mais importante, no âmbito do assunto abordado, qual seja, a tensão entre “democracia” e “judicial review” me pareceu muito fraca.
Nenhuma palavra sobre o sistema francês, que repele, historica e coerentemente, o ‘judicial review’. A polêmica Kelsen vs Schmitt, tão importante para a adequada solvabilidade, e/ou reflexão sobre a matéria, foi deixada praticamente de lado.
O poder constituinte invisível (ou oculto) – do qual nos alerta Rosa Russomano, no direito Inglês, não mereceu maiores considerações.
Afora as críticas acima, a parte que menciona o voto do Min. Barbosa acerca da petrificação dos Direitos Fundamentais merece destaque, pois é, em essência, a discussão do que modernamente se compreende por ‘efeito cliquet’, que causou tanta celeuma, ao lado de “constitucionalismo Thermidoriano” em recente prova para Membro do MPF.
Abraços.
Thiago.
Tiago,
Serah que poderia me ajudar com os dois conceitos acima: efeito cliquet e constitucionalismo thermidoriano?
Nem o Google acha algo interessante a respeito do segundo topico.
Abraco
Faber Ispionato,
Sobre constitucionalismo Thermidoriano, aparentemente o examinador gostaria de saber se o candidato tinha conhecimentos sobre a Revolução Francesa, em especial após o período que se seguiu a separação da cabeça de Robespierre de seu corpo. É uma questão de História, e não propriamente de Direito Constitucional.
O livro de Eric Hobsbawn “A era das revoluções” pode esclarecer melhor sobre o tema. Vale lembrar que Thermidor é um dos meses da revolução (que substituiu o calendário gregoriano pelo calendário revolucionário), tal como Pluvioso e Germinal (mais famoso como título de livro dos Irmãos Zola).
Robespierre morreu no dia 10 do III Thermidor. Quem sabe no próximo concurso eles perguntem algo sobre os outros acontecimentos passados em outros meses da Revolução Francesa durante os 14 anos de vigência do calendário Revolucionário (Vindimiário, Brumário, Frimário, Nivoso, Pluvioso, Ventoso, Germinal, Florial, Pradial, Messidor, Termidor e Fructidor) ou algo sobre a revolução Russa. Ou melhor dizendo, por que não incluem a matéria História Mundial no edital.
Sobre o “Efeito Cliquet”, o George tem artigo, aqui no blog, sobre o tema:
http://georgemlima.blogspot.com/2008/03/efeito-cliquet.html
ou
https://direitosfundamentais.net/2008/03/01/efeito-cliquet/
Há correlação com o chamado “princípio da vedação de retrocesso social”, e quem escreve sobre o assunto, com o nome “Aportuguesado” é o Prof. Ingo Wolfganf Sarlet, que tem um livro específico sobre o tema : “Direitos Fundamentais Sociais”, Ed. Renovar, e também dedica as páginas finais de sua obras mais famosa (A eficácia dos Direitos Fundamentais, Livraria do Advogado, p 401/461), abordando o assunto.
Trata-se de saber se os limites materias de reforma da constituição (cláusulas de pedra, art. 60, § 4º da Constituição da República) abrangem apenas os direitos e garantias individuais até então existentes, os direitos sociais e demais direitos e garantias fundamentais.
Imagine-se que o direito a moradia seja uma cláusula pétrea, ou se se acrescenta, por emenda Constitucional um inciso LXXIX no art. 5º que determina que , p. ex. “todo cidadão brasileiro tem direito a gratuidade de material didático de qualidade para acompanhamento, em sala de aula, da matéria dada, em todos os graus e níveis de escolaridade”. Ou ainda, na vertente mais visível, que seria a “flexibilização” dos direitos Trabalhistas, que não se inserem, explicitamente, no rol do art. 60, § 4º, haja vista que não são os direitos trabalhistas DGI.
Indaga-se: pode vir a ser revogado o direito a moradia, ou a totalidade dos direitos trabalhistas de estatura constitucional, ou o nóvel e hipotético inciso LXXIX do art. 5º? Seria considerado retrocesso vedado?
Reconheço que forcei a barra nos exemplos, mas a essência é mais ou menos essa, e tal discussão está engatinhando ainda no Brasil.
No site Jusnavigandi tem um artigo bastante interessante sobre o tema (FILETI, Narbal Antônio Mendonça. O princípio da proibição de retrocesso social. Breves considerações. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2059, 19 fev. 2009.), e como mencionado, o prof. Ingo W. Sarlet também escreve sobre o assunto.
As questões de nº 4 (Constitucionalismo Whig ou Thermidoriano – ítem ‘d’ cobrou o conhecimento sobre o assunto) e 10 (Efeito Cliquet – ítem ‘c’ cobrou o conhecimento sobre o assunto) do 24º (2008) Concurso para Procurador da República da seguinte maneira:
4 – É verdadeira a seguinte sentença:
a) O patriotismo constitucional defende as mudanças constitucionais exogenéticas.
b) É obrigação condicional do Estado-membro custear o exame de DNA em favor de hipossuficientes
c) A teoria constitucional discursivo-dialógica interliga autonomia pública e aotonomia privada
d) o constitucionalismo whig (ou Thermidoriano) defende mudanças constitucionais bruscas ou revolucionárias.
O Gabarito deu como correta a alternativa “C”
10 – É incorreto afirmar que:
a)A Jurisprudencia do STF acolhe a doutrina da eficácia externa dos Direitos fundamentais;
b)O efeito cliquet está mais diretamente associado aos direitos sociais;
c)A propriedade reconhecida constitucionalmente às comunidades remanescentes de quilombos, detém caráter individual e excepcionalmente coletivo;
d)Não viola a separação dos poderes a decisão judicial que impõe obrigação solidária de entes federativos para a distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes;
O Gabarito deu como correta (e portanto a única errada, a letra C)
Abraço.
Faber Ispionato,
Sobre constitucionalismo Thermidoriano, aparentemente o examinador gostaria de saber se o candidato tinha conhecimentos sobre a Revolução Francesa, em especial após o período que se seguiu a separação da cabeça de Robespierre de seu corpo. É uma questão de História, e não propriamente de Direito Constitucional.
O livro de Eric Hobsbawn “A era das revoluções” pode esclarecer melhor sobre o tema. Vale lembrar que Thermidor é um dos meses da revolução (que substituiu o calendário gregoriano pelo calendário revolucionário), tal como Pluvioso e Germinal (mais famoso como título de livro dos Irmãos Zola).
Robespierre morreu no dia 10 do III Thermidor. Quem sabe no próximo concurso eles perguntem algo sobre os outros acontecimentos passados em outros meses da Revolução Francesa durante os 14 anos de vigência do calendário Revolucionário (Vindimiário, Brumário, Frimário, Nivoso, Pluvioso, Ventoso, Germinal, Florial, Pradial, Messidor, Termidor e Fructidor) ou algo sobre a revolução Russa. Ou melhor dizendo, por que não incluem a matéria História Mundial no edital.
Sobre o “Efeito Cliquet”, o George tem artigo, aqui no blog, sobre o tema:
efeito-cliquet (nome do post)
Há correlação com o chamado “princípio da vedação de retrocesso social”, e quem escreve sobre o assunto, com o nome “Aportuguesado” é o Prof. Ingo Wolfganf Sarlet, que tem um livro específico sobre o tema : “Direitos Fundamentais Sociais”, Ed. Renovar, e também dedica as páginas finais de sua obras mais famosa (A eficácia dos Direitos Fundamentais, Livraria do Advogado, p 401/461), abordando o assunto.
Trata-se de saber se os limites materias de reforma da constituição (cláusulas de pedra, art. 60, § 4º da Constituição da República) abrangem apenas os direitos e garantias individuais até então existentes, os direitos sociais e demais direitos e garantias fundamentais.
Imagine-se que o direito a moradia seja uma cláusula pétrea, ou se se acrescenta, por emenda Constitucional um inciso LXXIX no art. 5º que determina que , p. ex. “todo cidadão brasileiro tem direito a gratuidade de material didático de qualidade para acompanhamento, em sala de aula, da matéria dada, em todos os graus e níveis de escolaridade”. Ou ainda, na vertente mais visível, que seria a “flexibilização” dos direitos Trabalhistas, que não se inserem, explicitamente, no rol do art. 60, § 4º, haja vista que não são os direitos trabalhistas DGI.
Indaga-se: pode vir a ser revogado o direito a moradia, ou a totalidade dos direitos trabalhistas de estatura constitucional, ou o nóvel e hipotético inciso LXXIX do art. 5º? Seria considerado retrocesso vedado?
Reconheço que forcei a barra nos exemplos, mas a essência é mais ou menos essa, e tal discussão está engatinhando ainda no Brasil.
No site Jusnavigandi tem um artigo bastante interessante sobre o tema (FILETI, Narbal Antônio Mendonça. O princípio da proibição de retrocesso social. Breves considerações. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2059, 19 fev. 2009.), e como mencionado, o prof. Ingo W. Sarlet também escreve sobre o assunto.
As questões de nº 4 (Constitucionalismo Whig ou Thermidoriano – ítem ‘d’ cobrou o conhecimento sobre o assunto) e 10 (Efeito Cliquet – ítem ‘c’ cobrou o conhecimento sobre o assunto) do 24º (2008) Concurso para Procurador da República da seguinte maneira:
4 – É verdadeira a seguinte sentença:
a) O patriotismo constitucional defende as mudanças constitucionais exogenéticas.
b) É obrigação condicional do Estado-membro custear o exame de DNA em favor de hipossuficientes
c) A teoria constitucional discursivo-dialógica interliga autonomia pública e aotonomia privada
d) o constitucionalismo whig (ou Thermidoriano) defende mudanças constitucionais bruscas ou revolucionárias.
O Gabarito deu como correta a alternativa “C”
10 – É incorreto afirmar que:
a)A Jurisprudencia do STF acolhe a doutrina da eficácia externa dos Direitos fundamentais;
b)O efeito cliquet está mais diretamente associado aos direitos sociais;
c)A propriedade reconhecida constitucionalmente às comunidades remanescentes de quilombos, detém caráter individual e excepcionalmente coletivo;
d)Não viola a separação dos poderes a decisão judicial que impõe obrigação solidária de entes federativos para a distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes;
O Gabarito deu como correta (e portanto a única errada, a letra C)
Abraço
Prof. George,
embora não seja o local apropriado, gostaria de saber onde anda o Adriano Costa(Drica). Tá fazendo falta. Ele é muito bom também.
Abraço
Valeu Tiago,
abraco
Prezado Professor George Marmelstein,
Venho, por intermédio desta, solicitar participar dessa lista de discussão sobre Direito Constitucional e Direitos Fundamentais.
Moro em Brasília onde se respira Direito. Sou Advogado, Especialista em Direito Constitucional e em Direito do Trabalho e gostaria de começar a trocar algumas idéias sobre os retrocitados temas neste ótimo espaço criado pelo Doutor.
Atenciosamente,
Paulo Paiva